Valor moral dos sentimentos

A aprovação recente pelo Congresso Nacional do encurtamento dos prazos para se efetivar o divórcio representa um verdadeiro tiro no pé na ideia do valor moral de nossos sentimentos. Isto porque, com a nova lei, cai por terra qualquer chance de uma reflexão mais madura acerca de nossos impulsos afetivos, muitas vezes dominados por arroubos momentâneos de decisões impensadas.

Ora, isto nos conduz diretamente ao que comenta KANT em sua famosa obra Fundamentação da Metafísica dos Costumes, na qual ele nos relata o caso de uma pessoa que passa a vida toda praticando o bem por ser ‘bonzinho’. Contudo, na opinião do famoso pensador alemão, isto não constitui ainda o dever moral, por não estarem dotados, aqueles sentimentos, do verdadeiro espírito de cumprir o dever pelo dever, isto é, o cumprimento de um compromisso que constitui uma obrigação, acima de nossas preferências.

Dessa forma, os sentimentos amorosos despertados na ocasião do enlace matrimonial só serão duradouros se vierem acompanhados de um mínimo de responsabilidade quanto ao novo status familiar, o que deveria superar a instabilidade provocada por momentos naturais de desentendimento. Só então a convivência assumiria algum valor moral, o que lamentavelmente a nova lei desconhece.

Outro caso paradigmático citado por Kant ocorre com alguém que pratica o bem esperando obter alguma retribuição, seja neste ou noutro mundo. Aqui também estaria ausente o verdadeiro valor moral, que para ser autêntico, dispensaria qualquer expectativa de recompensa. Assim, o verdadeiro valor moral do sentimento deverá ser desprendido e isento de compensações retributivas.

Neste caso, o que está em questão é a separação de nossos atos de vontade do seu verdadeiro propósito moral, que não dependeria de circunstâncias, mas estaria fundamentado em noções de praticar o que é consideramos correto, gostemos ou não. Ora, isto demandaria um heroísmo ético digno de nossa condição de seres humanos racionais, que, por natureza, devem superar nossas tendências sentimentais.

E com relação ao matrimônio, quais seriam nossos mínimos deveres morais? Em primeiro lugar, fazer dele a realização eterna do amor, mesmo que este não se realize nunca como desejamos. Em segundo lugar, prover a sua estabilidade, como condição primária para a criação saudável dos filhos. Por fim, manter sempre uma convivência de renúncia ao egoísmo, respeitando os membros da família em suas naturais limitações.

Em conclusão, ao tomarmos uma visão de perspectiva, parece que tanto a sociedade em geral como os políticos ainda não se deram conta do verdadeiro valor da instituição familiar como sustentáculo básico da sua própria existência, e qualquer medida que a enfraqueça, resultará igualmente em desagregação social. De fato, estamos necessitando urgentemente da criação de um código de sustentação da família, no qual seriam revogadas todas as leis que a enfraquecem, sob pena de agravarmos cada vez mais os problemas que daí derivam. Onde anda a imaginação de nossos legisladores?